sábado, 24 de janeiro de 2009

DOSSIÊ GAZA: Invasão, Massacres, Resistência

Achille Lollo

— A guerra imperial praticada por Israel

— Gaza uma Stalingrado no deserto?

— O mito dos foguetes Qassam e o Hamas

— A ONU e os esforços diplomáticos de Sarkozy

— Richard Falk, relator da ONU: “Um crime terrível contra o povo de Gaza”


No dia 27 de dezembro o Exército de Israel (Tsahal), o Serviço de Segurança Interna (Shin Bet) e o serviço secreto daquele país (Mossad) desferiram um ataque mortal (terra-ar-mar) contra a Faixa de Gaza, numa operação denominada ”Chumbo Fundido”, que até o fechamento desta edição, dia 13/01, (17º dia de ofensiva), já havia provocado a morte de 919 palestinos, incluíndo 353 mulheres, 285 crianças e 92 idosos, de acordo com o chefe dos serviços de emergência de Gaza.

Os ataques deixaram ainda 4.100 palestinos feridos e mais de 400 desaparecidos, cujos corpos permanecem de baixos dos escombros dos prédios públicos e das casas-alvos dos bombardeios.

Essa operação foi planejada durante os últimos seis meses para acabar com o governo do Hamas na Faixa de Gaza que, apesar de 18 meses de eficaz bloqueio econômico e militar israelense, nunca se rendeu. Outro objetivo estratégico da invasão é o de eliminar todo o grupo dirigente do Hamas e, sobretudo, acabar com seu braço militar, as Brigadas Ezzedim al-Qassam.

A primeira constatação a ser feita é que o Chefe de Estado Major da Defesa israelense, general Gaby Ashkenazy, determinou um excepcional grau ofensivo para atacar por ar, mar e terra todo o território da Faixa de Gaza, utilizando para isso uma capacidade bélica semelhante a dos EUA na última investida contra o Iraque de Sadat Hussein.

Por outro lado com a operação “Chumbo Fundido”, o Tsahal e o Shin Bet querem resgatar a derrota político e militar que o Hezbollah infligiu, em 2006, no Sul do Líbano.

É neste âmbito que os porta-voz do Estado Major e do Ministério das Relações Exteriores – contando com a benevolência da mídia ocidental e do forte lobby das comunidades judaicas no exterior - passaram a justificar a violência contra os civis palestinos como um ato de “autodefesa” responsabilizando o Hamas de utilizar as mesquitas e as escolas - inclusive aqueles administradas pela ONU - como “escudo humano” dos guerrilheiros ou pontos de lançamento de foguetes ou morteiros.

Essas mentiras foram legitimadas pelo presidente Shimon Perez. Porém, no dia 9, veio o primeiro desmentido no jornal israelense Haaretz. Chiris Gunnes, porta-voz das agência da ONU para os Refugiados (UNRWA), revelou que: 1) na escola da ONU bombardeada em Jabaliya, morreram 40 civis, na maioria crianças e mulheres; 2) Não havia guerrilheiros; 3) Os militares israelense manipularam a opinião pública com uma foto de 2007, quando na escola houve uma manifestação de militantes do Hamas.

Massacrar os civis

Muitos observadores, entre eles o Cardeal Martini, denunciaram o Exército israelense por estar enveredando na vertente da violência feroz contra os civis e equipararam os sofrimentos dos palestinos de Gaza aos dos judeus europeus perseguidos pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.

Uma tese que, evidentemente enfurece o governo e os militares israelenses. Porém, se, de fato, não pode haver comparação política entre Estado nazista e Estado sionista, a atuação do Tsahal e do Shin Bet é talvez mais criminosa por se tratar de instituições de um estado democrático (mesmo se restrito só aos judeus e árabes israelenses) e não de um regime ditatorial como foi o nazismo hitleriano.

O problema é que 81% da população israelense apoiaram a operação “Chumbo Fundido”, mesmo sabendo o que os civis palestinos iriam sofrer. Matar palestinos virou corriqueiro em Tel Aviv, tanto que intelectuais famosos e “progressistas” como Amoz Oz, Avi Mograbi e Abraham Yoshuha e os partidos “de esquerda” como o Meretz e os Trabalhistas, apoiaram a invasão e os bombardeios. Apenas 18% manifestaram sua preocupação com a população palestina de Gaza.

Para o exercito israelense (que não é formado por mercenários, mas por reservistas) o apóio da maioria da opinião pública foi fundamental para cumprir os objetivos da operação “Chumbo Fundido”. Por isso a pressão internacional ou a morte de 500 ou mil palestinos não vai sensibilizar os homens do Tsahal.

Para o Terceiro Reich de Hitler a solução final do Holocausto dos judeus europeus não era uma necessidade estratégica, mas sim uma forma para sustentar ideologicamente o nazismo na Europa. Agora, para os comandantes do Tsahal e do Shin Bet o massacre dos civis é um objetivo estratégicos que visa desarticular a confiança que os palestinos de Gaza mantêm no Hamas.

Portanto o sistemático bombardeio de escolas, mesquitas e casas populares – além de reforçar o egovingador do sionismo – é uma chantagem moral para destruir a imagem do Hamas na Palestina. Foi por disso que o presidente da Venezuela, Hugo Chavez considerou o bombardeio de Gaza mero Terrorismo de Estado.

Por outro lado essa invasão em Gaza - bem como todos os ataques e massacres perpetrados pelo Estado de Israel desde 1948 - visa, antes de tudo, impor ao mundo árabe o respeito pela cidadania israelense, o direito sagrado dos judeus sobre as terras dos palestinos e a aceitação de que o Estado Sionista é o bastião do Ocidental no Oriente Médio, principal fornecedor de petróleo para os EUA e a Europa.

Potência nuclear

Não foi por acaso que os EUA transformaram Israel em potencia nuclear, enquanto os programas de paz, (Camp David, Oslo, Taba e por último Annapolis) nunca definiram uma paz eqüitativa entre judeus israelenses e palestinos. Pelo contrário Carter, Clinton, Bush, Margareth Thatcher, Condolezza Rice, Tony Blair, Moubarak, Sarkozy, Javier Solana e por ultimo Benita Ferrero-Waldner visaram legitimar, apenas o conceito estratégico de um Estado Judaico soberano, dando aos palestinos só o direito de serem reconhecidos como uma minoria sem nenhuma perspectiva de soberania nacional.

De fato, em 2008, Dov Weisglass, braço direito de Sharon, explicava que “o inteiro pacote denominado Estado Palestino, com todas suas implicações, foi removido da agenda das negociações por tempo indeterminado e Abu Mazen e a cúpula dirigente do Fatha - conscientemente ou não - aceitaram o texto da conferência de Annapolis”. De fato, foi a partir deste momento que o Hamas endureceu as relações com o Fatha, inclusive após o primeiro ministro da ANP, Salam Faiyad, ter assinado com Condolezza Rice um acordo para a CIA treinar e organizar a polícia palestina nas Jordânia.

Gaza uma Stalingrado no deserto?

No dia 6 de janeireo, isto é no 12º dia de conflito quando havia 735 mortos e 2800 feridos palestinos contra seis soldados israelenses mortos e 30 feridos, o presidente israelense, Shimon Peres, afirmou reiteradamente que “Israel não havia atacado a Faixa de Gaza para voltar a ocupar este território, porém o conflito continuava até o Exercito alcançar todos seus objetivos”. Por sua parte, o Chefe de Estado Major da Defesa, general Gaby Ashkenazy , especificava que o Exército “pretendia estacionar nos territórios da Faixa de Gaza apenas, para realizar uma operação de definitiva limpeza anti-terrorista, destruindo toda a infra-estrutura do Hamas”.

O general Ashkenazy não esclarecia que o verdadeiro objetivo da operação “Chumbo Fundido” era o aniquilamento da estrutura política do Hamas (300 homens), de seu braço armado, as Brigadas Ezzedim al-Qassam (2.000 homens) e os grupos armados da Jihad Islâmica (1.000 homens).

Os sobreviventes dos 15.000 homens enquadrados nos batalhões da Tanfisiyeh (Guarda Nacional) deveriam ser “reeducados” pelo Shin Bet (Serviço de Segurança Interna) após um longo período de aprisionamento.

Na prática, esta seria a terceira fase da invasão conhecida por ”cerco e aniquilamento”, em que a infantaria e os grupos especiais devem penetrar nas cidades da Faixa de Gaza, correndo o risco dos combates de guerrilha urbana e das armadilhas explosivas predispostas pelas unidades da Tanfisiyeh em cada canto das cidades, além de interrogar/torturar os guerrilheiros presos para ter, rapidamente, informações preciosas sobre o funcionamento da rede e as estruturas dos insurgentes.

O problema desta “caça ao homem” é que os combate “casa por casa” podem provocar ainda mais massacres de civis e, sobretudo, baixas entre os soldados israelenses que, ao ser atacados pelos guerrilheiros, podem perder o controle e operar represálias sobre os civis, achando que cada homem, cada adolescente é um guerrilheiro escondido entre os civis.

Aliás, Alegre Pacheco da oordenação dos negócios Humanitários da ONU (OCHA) e Pierre Kraehenbuehl, do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICR), no dia 9 acusaram o Exército Israelense de violar as leis internacionais sobre as garantias de socorro aos feridos.

Crime de guerra

Por sua parte, o Washinton Post publicou no dia 10 uma denuncia do OCHA lembrando que os soldados israelense haviam obrigado 110 palestinos , na maioria mulheres e criança, a entrar em uma casa no bairro de Zeioton (zona sul da Cidade de Gaza) que depois foi bombardeada provocando a morte de 30 crianças e mais 10 mulheres e 3 homens. Uma chacina que muitos na ONU querem que seja investigada como crime de guerra do Exército israelense.

A verdade é que somente os militares e os falcões do governo (Haim Ramon, Meri Shetrit, Rafi Eitan, Daniel Fiedman e Avi Dichter), apostam na radicalização do confronto. O Ministro da Defesa, o trabalhista Ehud Barak e a conservadora Tzipi Livni (Ministra das Relações Exteriores) querem a continuação da operação sem correr o risco de baixas ou a captura de soldados israelenses nos combates urbanos, como aconteceu no sul do Líbano.

De fato, a preocupação dos dois ministros não é com as condenações internacionais ou pelo aumento das vítimas palestinas ou com as resoluções da ONU para um cessar fogo imediato. O problema são as eleições legislativas de 10 fevereiro, pois uma eventual baixa de soldados israelenses pode determinar a definitiva vitória de Netanyahu Benjamim, o líder direitista do Likud e herdeiro de Sharon, que já está com 40% do eleitorado israelense.

As perspectivas do conflito

Um elemento que apavora os estrategistas da inteligência militar é o falimento da teoria a “superioridade militar capaz de gerar vitórias políticas”, se de fato o Hamas:

1) Consegue resistir em Gaza a todo tipo de ataque — como aconteceu até dia 10 de janeiro, apesar das perdas materiais, os 919 mortos e mais de 4.100 feridos;

2) Se os Tanfisiyeh e as Brigadas Ezzedim al-Qassam conseguem manter o controle em Rafah e Khrbat Abu-Shafah (sul fronteira com Egito); Khan Yunus (sul); Nusayarat e Dahr al Balah (centro-sul); Gaza City e Saknat Azzarqah (centro norte); Jabaliya e Na Nazalah (Norte).

3) Se conseguem lançar contra Israel mais foguetes Qassam ou Grad;

4) Se os principais dirigentes sobrevivem aos bombardeios;

5) Se nos próximos quinze dias e iniciam no Egito a negociação entre o presidente francês, Sarkozy e o egípcio, Moubarak para um o cessar-fogo generalizado e o fim do embargo econômico.

Se o Hamas vai sobreviver será vitorioso não só do ponto de vista militar, mas, sobretudo em termos políticos, enterrando o laxismo de Abu Mazen e a burocrática cúpula do Fatha.

Uma vitória que, certamente, vai influenciar a população palestina da Cisjordânia nas eleições de maio para o renovo dos membros da ANP e seu presidente. De fato, outra derrota política de Abu Mazzem e do Fatha, equivale a uma pesada derrota estratégica do Estado Israel.

Além disso, a teoria da “execução dirigida”, que durantes anos empenhou os agentes do Shin Bet e do Mossad no assassinado preventivo de dirigentes da Frente Popular de Libertação da Palestina (FPLP), da FDLP, da esquerda do Fatha e do próprio Hamas - demonstrou seus limites, visto que além de fortalecer o sentimento de revolta (Intifada) contra o sionismo, não conseguiu desarticular as diferentes organizações palestinas.

Aquelas execuções emocionaram somente os rabinos ortodoxos e os sionistas do Likud, que viam nos foguetes dos helicópteros Apaches ou nas balas dundum dos francos atiradores do Shin Bet a mão vingadora de Deus. Na realidade foi um retumbante fracasso estratégico porque as grupos contrários ao reconhecimento do Estado Sionista ganharam apóio popular. Por isso o Fatha, após sua derrota política em Gaza, continua cada vez mais isolado e apegado ao monitoramento ocidental.

É neste âmbito que o porta-voz do Exercito, Avi Benayahu, no dia 4 de janeiro, declarava: “o objetivo da operação “Chumbo Fundido” é infligir ao Hamas um golpe duríssimo, reforçar o poder de dissuasão de Israel na região, além de tranqüilizar a população israelense no sul do país. Neste sentido é nossa intenção destruir toda a infra-estrutura terrorista do Hamas e assumir o controle em Gaza das áreas normalmente utilizadas para o lançamento dos foguetes. Os moradores da Faixa de Gaza não são um objetivo desta operação, porém aqueles que escondem terroristas ou armas em suas casas serão considerados terroristas, que são os únicos responsáveis da morte dos civis que eles usam como escudo humano”.

O mito dos foguetes Qassam e o Hamas

O foguete Qassam, possui uma tecnologia primária muito utilizada pelos movimentos de libertação para construir seus foguetes artesanalmente. Não há mecanismos que corrijam a rota ou que reconheçam os alvos. Além disso, o pessoal do Hamas inverteu as características do foguete Qassam, tornando-o um meio de “propaganda armada”. De fato, foi ampliado o compartimento do combustível, reduzindo o da carga explosiva. Desta forma, o Qassam alcança uns 30 quilômetros provocando estrago semelhante ao de uma granada de mão. Por não ter nenhum sistema de camuflagem eletrônica, é facilmente detectado pelos radares ou os aviões de reconhecimento-drone (sem piloto) e pode ser abatido com um foguete ar-ar.

Para Israel é mais rentável manipular suas populações com o medo dos Qassam e construir milhares de abrigos anti-foguetes do que colocar ao longo da fronteira com Gaza as baterias de foguete ar-ar que explodiriam os Qassam logo no início de seu voo.

Na edição do jornal israelense Haaretz, o jornalista Nehemia Strassler lembra que até 3 de novembro, o Hamas respeitou a trégua e não disparou nenhum foguete, além de impedir os grupos da Jihad Islâmica de fazê-lo. Entretanto, no dia 4 de novembro o Exército israelense ensaiava a operação “Chumbo Fundido” invadindo o setor central da Faixa de Gaza, entre Nusayarat e Saknat Azzarqa, para destruir uma casa de onde o Hamas – segundo o porta-voz do exército - deveria começar a escavação de um túnel que desembocaria em território israelense. A seguir a Força Aérea bombardeava o carro de um líder do Hamas, matando o motorista e mais quatro pessoas que no comunicado do Tsahal eram apontados como “terroristas”.

O Haaretz, lembra alguns setores do Hamas acreditavam que Israel teria renovado a trégua no dia 19 de dezembro, para depois iniciar a negociar o fim do bloqueio caso o Hamas aceitasse a alternativa de “dois Estados por dois Povos”.

O ataque de quatro de novembro foi um brutal alerta para o Hamas que, logo, se preparou para resistir. Nesse sentido sua organização voltou a ser compacta e ao mesmo tempo descentralizada, com um crescente apóio popular em função do bloqueio econômico realizado por Israel com o apóio de EUA e União Européia.

Hamas

O Hamas se divide em quatro setores:

1) o movimento religioso ligado ao fundamentalismo chita ;

2) os serviços sociais (cresces, ambulatórios, escolas, universidades, rádios e empresar comunitárias e demais serviços públicos);

3) o partido político;

4) o braço armado (Brigadas Ezzedim al-Qassam).

A direção política é representada pelo grupo de Khaled Meshaal que, a partir da capital da Síria, Damasco, se ocupa das relações diplomáticas e das finanças. Em Gaza e na Cisjordânia a direção política é local com uma assembléia permanente de cinqüenta dirigentes que tomam decisões quase sempre em regime de semi-clandestinidade para fugir as emboscadas do Mossad israelense.

A ala militar criou um sistema de clandestinidade no qual as células são compostas compor no máximo dez militantes que operam absolutamente desligados do partido e do movimento de que recebem apenas orientações formais. Cada célula tem seu laboratório para construir artesanalmente os foguetes Qassam, enquanto os Grad são importados da China e os Faijr3 do Irão. Estes foguetes, bem como o material para construir os Qassam chega pelos túneis construídos debaixo da fronteira egípcia – expediente utilizado após o presidente egípcio, Moubarak, fechou a fronteira (Porta de Rafah), apoiando o bloqueio econômico e militar de Israel.

Segundo a inteligência israelense, citada pelo site “Debkafiles”, a capacidade militar do Hamas foi atingida somente em 15%, de forma que lhe sobram ainda uns 10.000 foguetes Qassam e uma centena de Grad e Fajr3 cuja ogiva de 70 quilos o faz voar até 50 quilômetros.

Mohammad Nazzal, confirmava em Damasco que o exército israelense, até dia 11 conseguiu matar um líder político do Hamas, Nizar Rayan e dois chefes das Brigadas Ezzedim Qasdsam , Abu Zakaria Al Jamal e Muhhad Shalfuk, enquanto Jihad Adam ficou gravemente ferido nos combates em Khan Yunes.

Por isso o responsável político do Hamas em Gaza, Moushir Al-Masri em uma entrevista na TV Al Jazira declarava que “o inimigo, apesar dos contínuos bombardeios e ataques pelo mar, terra e ar não conseguiu alcançar seus objetivos. A resistência, com os poucos meios de defesa que dispõe surpreendeu o exército sionista. O inimigo não vai reconhecer sua incapacidade em derrotar a resistência e graças a farsa do Conselho de Segurança vai continuar bombardeando sobretudo as áreas onde se encontram nossas populações”.

A ONU e os esforços diplomáticos de Sarkozy

Assim que o Exercito israelense iniciou os bombardeios contra a Faixa de Gaza, os países da União Européia logo se solidarizaram com Israel. O governo e a mídia dos EUA quase que idolatraram os governantes de Tel Aviv. Por sua parte, os governos árabes moderados (Arábia Saudita, Jordânia, Iraque e Egito) ficaram calados manifestando, apenas “preocupação”.

O silencio de Obama e de Hillary Clinton, além de confirmar seu posicionamento pro-Israel, reforçou as pressões do lobby judaico na mídia, enquanto o Conselho de Segurança e a Assembléia da ONU congelaram suas atividades durante a primeira semana do conflito. Somente o presidente francês Sarkozy e o Papa Bento 16 apontaram os riscos de uma crise humanitária.

A defesa radical do ataque por parte de Bush, contagiou o servilismo do presidente da União Européia, o checo Mirek Topolanek, mas não pôde evitar que Sarkozy entrasse em campo, escolhendo o Egito de Moubarak e a Síria de Baschar Assad para construir uma negociação capaz de legitimar as duas parte, Israel e o Hamas.

Por isso os EUA recorreram a Assembléia das Nações Unidas para formular uma resolução para um cessar-fogo imediato das duas partes. Na realidade, esta resolução favorecia Israel, visto que nada dizia sobre o bloqueio econômico-militar contra a Faixa de Gaza que agora entra no 19ºmês.

A verdade é que o governo de Israel rejeitou a resolução da ONU porque precisa atacar o Hamas até a véspera das eleições de 10 de fevereiro. Por isso a Ministra das Relações Exteriores, Tpzi Livni, pedia a Condolezza Rice de informar aos EUA o Conselho de Segurança de que Israel aceitará o cessar-fogo somente quando:

1) a ONU realizava o desarmamento preventivo do Hamas;

2) O governo de Gaza fosse devolvido ao Fatha de Abu Mazzen;

3) Fosse introduzido um processo de internacionalização dos territórios de Gaza, dando ao Egito o papel de “fiscal fronteiriço”, enquanto um corpo de expedição árabe-europeu controlaria a fronteira de Gaza com Israel por uma banda de 30 km, de onde o Exército israelense se retiraria.

É evidente que o Hamas nunca vai aceitar as condições de Israel. Permanece uma vaga esperança para o plano de Sarkozy que o Hamas julgou “interessante”. O problema é que a troika do governo israelenses (Olnert-Livni-Barak) ainda aposta em uma solução militar que possa promover a afirmação de novos parceiros políticos dispostos a negociar o cessar-fogo com base as condições de Israel.

Richard Falk, relator da ONU: “Um crime terrível contra o povo de Gaza”

No passado dia 15 de dezembro, o professor Richard Falk, após desembargar no aeroporto Bem Gurion de Tel Aviv, como Chefe da missão da ONU encarregado de investigar a violações dos direitos humanos nos territórios da Cisjordânia e na Faixa de Gaza, era expulso pela polícia por ser considerado “antissemita”. Nesta entrevista telefônica, Michelangelo Cocco, do jornal italiano il Manifesto pediu ao professor Falk sua opinião sobre a invasão em Gaza.

Michelangelo. Cocco — Professor Falk, a ministra das relações exteriores de Israel, Tzipi Livni, declarou que “não há nenhuma crise humanitária em Gaza”.

Richard Falk: Bombardear diariamente uma população indefesa e em uma área densamente povoada como é a Faixa de Gaza é sem duvida um crime.

Michelangelo Cocco — Acredita que o governo israelense deve ser perseguido juridicamente?

Richard Falk: Sim, o direito penal internacional não deveria perseguir apenas os derrotados, como aconteceu nos últimos 15 anos.

Michelangelo Cocco — Nos últimos dias se falou muito em “trégua humanitária”. Acha que pode ajudar?

Richard Falk: Qualquer diminuição da emergência é bem vinda. Porém é preciso lembrar que os efeitos de 18 meses de um bloqueio extremo que negou a população alimentos, combustível e medicamentos têm criado uma situação de sofrimento e uma deterioração da mesma.

Michelangelo Cocco — Mesmo assim o governo israelense continua dizendo que tem o pleno direito de se defender após o lançamento de foguetes contra seu território

Richard Falk: Em teoria Israel, enquanto Estado soberano, tem direito a sua auto-defensa. Porem o uso indiscriminado de caça-bombardeiros F-16 e dos helicópteros Apache contra uma população sem nenhuma defesa é incontestável. Há, também, relatórios que apontam o uso do urânio empobrecido nas bombas chamadas “bunker buster”, para destruir os túneis que interligam gaza com o Egito. Neste âmbito temos que lembrar que o embargo contra um povo praticado em regime de ocupação pode ser considerado um ato de guerra.

Michelangelo Cocco — A imprensa israelense justificou sua expulsão porque você disse que a situação dos palestinos em Gaza era semelhante aos dos judeus na Europa durante a ditadura nazista

Richard Falk: Nunca disse que era a mesma coisa. Porém acredito que a maneira de como foram concebidas as políticas contra o povo de Gaza podem ser equiparadas as terríveis experiências que os judeus europeus sofreram. (Tradução de A. L.)

Nenhum comentário:

Postar um comentário