Falso Califato: perfeito ativo estratégico dos EUA | ||||||||||||
[*] Pepe Escobar, Sputnik
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
O ocidente “civilizado” chora abundantes lágrimas de crocodilo, quando a pérola do deserto da Antiga Rota da Seda, Palmira, cai sob as garras do ISIS/ISIL/Daesh.
Contudo, nem o Presidente Barack Obama dos EUA nem qualquer de suas 22 nações-vassalas pesadamente armadas que formam teoricamente a coalizão de vontades dele mandou para lá um drone equipado com míssil Hellfire, que fosse, contra os bandidos vestidos de negro do falso Califato.
Pode-se argumentar que o ocidente “civilizado” prefere negociar com um Califato cheio de wahhabistas medievais intolerantes, a negociar com um “ditador árabe” secular que “se recusa a prostrar-se de joelhos ante o altar do neoliberalismo ocidental”.
Paralelamente, já se disse que os que armaram os degoladores da Frente Al-Nusra, também conhecida como al-Qaeda na Síria, ou ISIS/ISIL/Daesh são predominantemente sauditas – os maiores importadores de armas do planeta – que compram armas principalmente dos EUA, mas também da França e da Grã-Bretanha.
E agora, documento de agosto de 2012, da Agência de Inteligência do Departamento de Defesa dos EUA [Defense Intelligence Agency (DIA)] que circulou por todas as mãos, do CENTCOM à CIA e ao FBI, obtido por ordem judicial pela empresa Judicial Watch, finalmente confirma o que passa por “estratégia” de Washington no Levante e na Península Árabe.
E, assim como a proto-Al-Qaeda original fundada pela CIA, estabelecida nos anos 1980s em Peshawar, o ISIS/ISIL/Daesh, também conhecida como al-Qaeda 2.0, serve ao mesmo objetivo geopolítico.
O resumo é que o ocidente “civilizado”, ombro a ombro com vassalos tipo Turquia e petromonarquias do Golfo, “deram apoio” ao braço da al-Qaeda na Síria para desestabilizar Damasco – apesar de o Pentágono estar prevendo o resultado sinistro que disso adviria, como a emergência do ISIS/ISIL/Daesh (ver também matéria detalhada de Brad Hoff, em 22/5/2015, redecastorphoto: EUA – Agência de Inteligência da Defesa, 2012: Ocidente facilitará ascensão do Estado Islâmico ‘para isolar regime sírio’, Levant Report [traduzido] NTs).
Pelo raciocínio do Pentágono, aí estaria um ativo estratégico de valor incalculável, a ser usado para “isolar o regime sírio”.
É irrelevante que o relatório da Inteligência da Defesa dos EUA não diga, com todas as letras, que o governo dos EUA inventou o ISIS/ISIL/Daesh, ou que favorece a al-Nusra na Síria ou o falso Califato no Iraque.
O ponto chave é que o documento mostra que governo dos EUA fez nada, absolutamente nada, para impedir que a Casa de Saud, os vassalos no Conselho de Cooperação do Golfo e a Turquia “apoiassem” a “oposição” síria – naquele ardente desejo desses todos de facilitar a emergência de um estado salafista à parte no leste da Síria e atravessando a fronteira, incluindo território iraquiano.
Agora, já não há observador bem informado que não saiba que a “guerra ao terô” iniciado pelo governo Cheney é completa fraude. Assim sendo, não é surpresa que a destruição planejada do “Siriaque” [orig. “Syraq”] atualmente em andamento ofereça ao complexo industrial militar dos EUA o pretexto perfeito para super armar, com bilhões de dólares em armas, a Casa de Saud, outros vassalos reunidos no CCG, Israel e Iraque.
Essa confluência de interesses – geopolíticos, para o Pentágono; comerciais, para o complexo industrial militar – completa o cenário da Casa de Saud virtualmente ditar a política exterior do governo autodefinido de Obama como “Não faça merda coisa estúpida” no Levante e na Península Árabe.
No início de junho/2015 haverá em Paris uma reunião de todos os 22 estados membros da coalizão de Obama. Até lá, o Pentágono terá de ter algum plano de o que fazer do seu ISIS/ISIL/Daesh; ir ao tudo ou nada e tentar aniquilá-lo (muito improvável), ou empurrar os esquadrões de paus-mandados na direção do Cáucaso (nada improvável). O mais provável, em todos os casos, é que a coisa continue como está.
E a Rússia sabe de tudo
O coronel-general Igor Sergun, chefe do Diretorado Superior de Inteligência [orig. Main Intelligence Directorate (ru. GRU)] do Comando Geral das Forças Armadas da Rússia praticamente jamais fala em público. Por isso, quando ele fala, as placas geopolíticas tectônicas se agitam.
A análise de Sergun encaixa-se perfeitamente ao relatório da AID. Já há anos a inteligência militar russa concluiu – e agora está divulgando publicamente – que “o terrorismo islâmico” ou, de fato, a “guerra ao terô” toda ela, é ferramenta ocidental usada para esmagar nações soberanas que se atrevam a fazer oposição ao hegemon.
E como todos nós sabemos, é claro que é muito mais fácil subverter e/ou esmagar Iraque, Líbia ou Síria, que Rússia ou China. Ou, por falar disso, o Irã.
Entrementes, o Império do Caos tem de se empenhar muito para conseguir lidar com – ou exibir cara de quem estaria conseguindo lidar – com o revide gerado por sua posição de Dividir e Governar. No Iraque, a queda de Ramadi deu ao ISIS/ISIL/Daesh um grande impulso de Relações Públicas, em termos de alcance estratégico, para recrutar novos soldados e para levantar cada vez mais dinheiro. Fizeram a equipe-aquela, de “Não façam merda coisa estúpida”, de idiotas.
E os EUA não foram sequer espectadores secundários da queda. Ramadi caiu porque o governo de Bagdá recusou-se a dar armas às tribos sunitas da província de Anbar. O falso Califato atacou a cidade com uma frota de 30 caminhões carregados de explosivos e com suicidas-bomba ao volante. As tribos que defendiam a cidade tiveram de desaparecer, porque sabiam que seriam massacrados pelos bandidos do Califato.
E o que fazia o Pentágono naquele momento? Nada – contradizendo a errada acusação do El Supremo do Pentágono, Ash Carter, para quem as forças iraquianas não tinham “vontade de lutar”. O Pentágono também nada fez em Tikrit, quando os norte-americanos recusaram-se a lutar contra o falso Califato ao lado de milícias xiitas comandadas por oficiais vindos do Irã e que se reportavam diretamente ao famosíssimo super comandante da Força al-Quds, brigadeiro-general Qassem Suleimani.
É Irã contra os degoladores
Agora a queda de Ramadi deixa bem claro que a verdadeira potência que está dando combate ao ISIS/ISIL/Daesh no Iraque é o Irã, não os EUA. Milícias xiitas já estão sendo incorporadas às forças de segurança do Iraque.
Ezzat al-Douri, ex-n.2 de Saddam Hussein – que os EUA não prenderam até hoje – tem distribuído mensagens sobre a urgente grande necessidade de ajuda armada que venha dos suspeitos de sempre, Arábia Saudita, ainda que os sauditas tenham tentado armar as tribos em Anbar, através da Jordânia. Adivinhem quem disse “não”? Washington. Segundo as tortuosas e vacilantes regras do governo Obama, a Jordânia só poderia fazer o jogo dos sauditas se viesse uma autorização de Bagdá, que nunca veio.
Essa confusão quase impenetrável é só um exemplo do jogo duplo que o Império do Caos joga nessa “guerra ao terô” – que se resume à elaborada farsa que é a “luta” contra o ISIS/ISIL/Daesh em todo o “Siriaque”.
Aconteça o que acontecer em Washington no futuro próximo, sob Hillary “Viemos, vimos, ele morreu” Clinton ou sob Jeb “Meu irmão acertou na invasão” Bush, não se vê nem sinal de que o governo dos EUA pare algum dia de usar o “terrorismo islamista” como ativo estratégico.
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[*] Pepe Escobar (1954) é jornalista, brasileiro, vive em São Paulo, Hong Kong e Paris, mas publica exclusivamente em inglês. Mantém coluna no Asia Times Online; é também analista de política de blogs e sites como: Sputinik, Tom Dispatch, Information Clearing House, Red Voltaire e outros; é correspondente/ articulista das redes Russia Today, e Al-Jazeera. Seus artigos podem ser lidos, traduzidos para o português pelo Coletivo de Tradutores da Vila Vudu e João Aroldo, no blog redecastorphoto.
Livros:
– Globalistan: How the Globalized World is Dissolving into Liquid War, Nimble Books, 2007.
− Red Zone Blues: A Snapshot of Baghdad During the Surge, Nimble Books, 2007.
− Obama Does Globalistan, Nimble Books, 2009.
− Adquira seu novo livro Empire of Chaos, publicado no final de 2014 pela Nimble Books.
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Duas cartas, de igual teor, datadas em 09/06/2015, dirigidas ao Secretário Geral das Nações Unidas e ao Presidente do Conselho de Segurança, por parte do Ministério das Relações Exteriores e Expatriados da República Árabe da Síria.
A República Árabe da Síria exige das Nações Unidas e, em especial, do
Conselho de Segurança, a adoção de medidas imediatas contra o regime do Qatar,
apoiador dos grupos terroristas armados na Síria, que cometeram os mais brutais
e sanguinários crimes contra o Estado e o povo da Síria, e a punição dos
responsáveis, de acordo com as resoluções do Conselho de Segurança sobre o
combate ao terrorismo, especialmente as cinco resoluções supracitadas
Com base
nas instruções do Governo da República Árabe da Síria, gostaria de transmitir,
a Vossas Senhorias, a rejeição do Governo do meu país às falsas alegações
citadas na carta do regime do Qatar, emitida através do documento No.
S/332/2015, que vêm no contexto de suas tentativas desesperadas de melhorar a
sua imagem, de suas práticas de apoio ao terrorismo, da distorção dos fatos e
de dispersar as atenções dos países membros das Nações Unidas, de modo geral, e
do Conselho de Segurança, de modo especial, quanto ao apoio direto dado pelo
regime do Qatar aos grupos terroristas armados, para aterrorizar o povo sírio e
atingir a segurança e a estabilidade do Estado sírio. A seguir, alguns dos
fatos que provam o envolvimento direto do Qatar no derramamento de sangue sírio
e no apoio ao terrorismo:
- Ironicamente, o regime do Qatar uniu-se ao refrão dos países que apresentam cartas, de igual teor, ao Conselho de Segurança e ao Secretário Geral contra a Síria, recheadas de distorções e de inversões dos fatos, especificamente quando alegam que a Síria usou armas químicas contra o seu povo, ao tempo em que a Organização para a Proibição de Armas Químicas afirmou que a Síria cumpriu com o seu compromisso, de acordo com o Tratado de Não Proliferação de Armas Químicas e em cooperação total com a Comissão Técnica da Organização. As alegações, nas quais se basearam as cartas do Qatar, não despertam senão a zombaria, porque foi a Síria quem pediu a investigação sobre uso de armas de cloro, por parte dos grupos terroristas armados, contra os civis inocentes nas cidades e vilarejos sírios. A posição das autoridades do Qatar e outros é uma defesa clara de seus aliados declarados, como a Jabhat Al Nusra e o ISIS (Daesh), além de outros grupos terroristas ligados à Al Qaeda, especialmente porque as informações disponíveis indicam que os governos do Qatar, da Arábia Saudita, da Turquia e outros estão suprindo os terroristas com estes materiais tóxicos para difamar o Governo da República Árabe da Síria e denegrir a sua imagem.
- Os meios midiáticos do Qatar, em todos os níveis, promovem uma campanha de propaganda e promoção dos grupos terroristas armados ativos em território sírio e os defendem à exaustão. O Canal Al Jazeera recebeu como convidado, em 27 de maio de 2015, em seu programa ‘Sem Fronteiras’, o conhecido como ‘Abu Mohamad Al Jolani’, emir da organização Jabhat Al Nusra, (citado na lista da comissão do Conselho de Segurança sobre a Al Qaeda), com o qual realizou uma entrevista para promover o terrorismo e as organizações terroristas e para dirigir mais ameaças ao Governo e ao povo sírio. A aparição do chamado ‘Abu Mohamad Al Jolani’ num canal de mídia, nada mais é do que uma prova definitiva e reiterada sobre a relação orgânica e a cooperação estreita entre esta organização terrorista, o canal Al Jazeera e as autoridades qataris, detentoras deste canal, que fala em nome da família governante do Qatar, responsável pela definição das políticas midiáticas, promocionais e de incitação do mesmo. A realização desta entrevista é uma flagrante violação das resoluções das Nações Unidas, relativas ao combate ao terrorismo, especialmente a resolução No. 1624, relativa à incitação ao terrorismo.
- O Ministro de Relações Exteriores do regime do Qatar considerou, durante uma entrevista com o jornal francês Le Monde, em 11 de maio de 2015, realizada no coração de um país membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que a cooperação com a organização Jabhat Al Nusra e com os grupos terroristas ligados à ela ou ramificados dela é um fato inevitável. Citamos o seguinte trecho da entrevista: “Nós somos contra qualquer extremismo, mas todos estes grupos, com exceção do ISIS (Daesh), lutam para derrubar o regime e os moderados não podem dizer à Jabhat Al Nusra: ‘Fique em casa! Não atuaremos com vocês’…temos que olhar para a situação no terreno e sermos realistas”. Esta declaração feita pelo Ministro das Relações Exteriores do regime do Qatar é considerada um franco reconhecimento do chefe da diplomacia qatari sobre o apoio e a aceitação da cooperação com a organização terrorista Jabhat Al Nusra, o que representa uma flagrante violação das resoluções do Conselho de Segurança relativas ao combate ao terrorismo, especialmente as resoluções Nos. 1373, 2170, 2178 e 2199.
- A carta do representante do regime do Qatar cita o chamado ‘esforço de mediação’ promovido pelas instituições governamentais do Qatar. Neste sentido, o Governo da Síria assinala que tais instituições governamentais diferem das demais instituições governamentais do mundo todo, ao atuar como mediadoras junto aos vários grupos terroristas, como a Al Qaeda e a Jabhat Al Nusra, para libertar os reféns e as pessoas sequestradas pelas organizações terroristas na Síria, incluindo o conhecido sequestro dos membros das forças da UNDOF e outros no mundo todo. A atitude apressada do regime do Qatar em servir de mediador e em avalizar o pagamento de resgates, avaliados em milhões de dólares, somente confirma o seu contato, a sua estreita coordenação com os grupos terroristas armados e a utilização destas situações como meio de fornecer um financiamento declarado aos grupos terroristas armados.
A República Árabe da Síria exige
das Nações Unidas e, em especial, do Conselho de Segurança, a adoção de medidas
imediatas contra o regime do Qatar, apoiador dos grupos terroristas armados na
Síria, que cometeram os mais brutais e sanguinários crimes contra o Estado e o
povo da Síria, e a punição dos responsáveis, de acordo com as resoluções do
Conselho de Segurança sobre o combate ao terrorismo, especialmente as cinco
resoluções supracitadas.
Tradução: Jihan Arar
Sana.sy